Brasília – O Congresso Nacional deve oficializar nesta terça-feira (17), às 12h, a criação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) destinada a investigar fraudes bilionárias no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A leitura do requerimento que cria a comissão será feita pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), após semanas de pressão de parlamentares da oposição e negociações com o governo federal.
Composição e comando da CPMI
A CPMI será composta por 15 deputados e 15 senadores titulares, com igual número de suplentes, e terá um prazo de 180 dias para concluir as investigações. O custo estimado dos trabalhos é de R$ 200 mil.
A presidência ficará a cargo do senador Omar Aziz (PSD-AM), aliado do governo Lula, enquanto a relatoria será conduzida por um parlamentar do Partido Liberal (PL), maior bancada de oposição ao governo. Os nomes mais cotados para a função de relator são Coronel Crisóstomo (PL-RO), autor de um dos pedidos de CPI na Câmara, e Coronel Fernanda (PL-MT), uma das principais articuladoras da comissão.
Aziz, que também presidiu a CPI da Covid em 2021, afirmou que pretende conduzir os trabalhos com “isenção e responsabilidade”, apesar de ser visto com desconfiança pela oposição por sua proximidade com o Palácio do Planalto. Ele também é pré-candidato ao governo do Amazonas em 2026, o que amplia o peso político de sua atuação.
O que será investigado
O foco da CPMI será apurar a prática de descontos indevidos em aposentadorias e pensões do INSS, promovidos por associações e entidades que, segundo as investigações iniciais da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU), teriam fraudado autorizações de beneficiários para reter valores diretamente nos benefícios.
O esquema, que teria começado ainda em 2019, durante o governo Jair Bolsonaro, ganhou força nos últimos anos, causando prejuízos estimados em R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024. Um dos levantamentos mais recentes, divulgado pelo site Metrópoles, aponta que só em um ano o montante desviado por meio de descontos não autorizados chegou a R$ 2 bilhões.
As fraudes afetaram milhares de aposentados e pensionistas, que descobriram os descontos ilegais ao consultar seus extratos bancários. Entre os investigados estão dirigentes de entidades de classe e servidores públicos que teriam facilitado os esquemas por meio de convênios irregulares com o INSS.
Bastidores e disputa política
Embora o requerimento tenha sido protocolado em 12 de maio de 2025 pelas senadoras Damares Alves (Republicanos-DF) e Coronel Fernanda (PL-MT), a leitura do pedido foi adiada por mais de um mês por decisão de Alcolumbre, que enfrentou forte pressão tanto da oposição quanto de setores do governo.
O documento contou com 223 assinaturas de deputados (o mínimo necessário era 171) e 36 de senadores (mínimo de 27), incluindo nomes de partidos da base governista como União Brasil e Progressistas (PP), o que evidencia a divisão interna nas bancadas.
A oposição, liderada por parlamentares ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro, pretende usar a CPMI como instrumento para desgastar o governo Lula, destacando falhas na fiscalização e alegando omissão da atual gestão do INSS. Por outro lado, o Planalto aposta na narrativa de que o esquema começou durante a administração anterior e que já existem investigações em andamento pela PF e pela CGU.
O governo escalou senadores experientes, como Randolfe Rodrigues (PT-AP), Fabiano Contarato (PT-ES) e Jaques Wagner (PT-BA), para atuar diretamente nos debates da CPMI e conter o avanço da oposição.
Sessão decisiva e próximos passos
A leitura do requerimento está prevista para ocorrer durante sessão do Congresso que também terá a análise de mais de 60 vetos presidenciais, incluindo temas polêmicos como o veto à pensão vitalícia para vítimas da zika. O acúmulo de votações pode atrasar a instalação formal da CPMI.
Após a leitura, os líderes partidários terão um prazo para indicar os membros da comissão. A expectativa é que a instalação oficial da CPMI ocorra apenas em agosto, após o recesso parlamentar e os festejos juninos. Na primeira reunião, Omar Aziz e o relator escolhido serão eleitos formalmente, e o plano de trabalho será apresentado.
Convocações e investigações
A CPMI deve convocar para depoimentos dirigentes do INSS, representantes das entidades suspeitas de envolvimento nas fraudes, servidores públicos, além de ex-ministros da Previdência Social dos governos Bolsonaro e Lula. Também está previsto o compartilhamento de relatórios da Polícia Federal e da CGU.
Entre as medidas que poderão ser sugeridas pela comissão estão o bloqueio de bens de envolvidos, mudanças na legislação sobre consignados e convênios com o INSS, além da responsabilização criminal de agentes públicos e privados.
Clima de tensão
Analistas políticos avaliam que a CPMI tem potencial para se transformar em um palco de embates partidários, com trocas de acusações entre governo e oposição. Críticos da comissão temem que ela siga o caminho de outras CPIs recentes, priorizando disputas políticas em vez de soluções concretas.
Por outro lado, especialistas em direito previdenciário consideram que a apuração pode ser uma oportunidade para rever falhas estruturais no sistema de controle de descontos no INSS e proteger a população idosa de novos prejuízos.